RESUMO
Luciani Modesto de Almeida
Andreia dos Santos Silva
As aplicações do exame neuropsicológico têm variado
ao longo do desenvolvimento das disciplinas relacionadas ao comportamento, à
cognição e neurociências de forma geral. De inicio, o exame neuropsicológico se
aplicava a Neurologia como localizador e -identificador de lesões cerebrais
focais e à Psiquiatria como meio de distinguir entre pacientes orgânicos, onde
alterações do comportamento e da cognição eram geradas por alterações cerebrais,
e pacientes funcionais, que tinham alterações não orgânicas ou psicodinâmicas.
Entretanto, com o notável aprimoramento dos exames de neuroimagem, permitindo a
localização de lesões e disfunções sutis, entre outros, o eixo da investigação
em neuropsicologia mudou.
A partir do desenvolvimento dessas técnicas mais
eficazes, a avaliação não mais concentra seu interesse apenas na localização,
mas no estabelecimento da extensão, do impacto e das consequências cognitivas,
comportamentais e na adaptação emocional e social que tais disfunções e lesões
podem acarretar nas pessoas. Sua importância reside principalmente na prevenção
e detecção precoce de distúrbios do desenvolvimento /aprendizado, indicando de
forma minuciosa o ritmo e a qualidade do processo e possibilitando um
“mapeamento” qualitativo e quantitativo das áreas cerebrais e suas interligações
(sistema funcional), visando intervenções terapêuticas precoces e precisas,
tornando-se assim, um dos componentes essenciais das consultas periódicas
infantis. Contudo, quando se pensa em aplicar uma avaliação em crianças ,
primeiro é preciso compreender a relação entre cérebro e desenvolvimento
infantil, entendendo que neste processo há um crescimento não só físico, como
também neurológico, comportamental e emocional, levando em conta o contexto que
tais aspectos estão inseridos, como classe social, estrutura familiar, educação
e saúde, pois todos estes fatores podem influenciar de forma significativa nos
resultados da avaliação.
Em relação à Psiquiatria, a Neuropsicologia auxilia
não só na identificação de lesões cerebrais e na avaliação longitudinal do
declínio cognitivo associado a certas doenças psiquiátricas, como também
favorece o desenvolvimento de teorias a respeito da localização neuroanatômica
de sintomas de diversos transtornos, além disso, permite uma avaliação objetiva
do comportamento do individuo, observado através da sua habilidade em
desempenhar determinadas tarefas. Sendo assim, é de extrema relevância na
definição de vários distúrbios neuropsicológicos, como os relacionados ao
espectro das lesões cerebrais, os específicos de aprendizagem, como a dislexia,
ou o TDAH, cabendo ao neuropsicólogo não só estabelecer o perfil do déficit
(fraqueza) e sua extensão funcional, mas também as habilidades preservadas
(forças). Pode ser expressa qualitativamente, através da observação dos
comportamentos do paciente, como ansiedade, desatenção ás instruções,
impulsividade e cansaço, e quantitativamente, utilizando testes psicométricos e
neuropsicológicos, organizados em baterias fixas ou flexíveis, e os resultados
refletem os principais ganhos ao longo do desenvolvimento e tem o objetivo de
determinar o nível evolutivo especifico da criança.
Esta gama de técnicas e instrumentos será utilizada
para o levantamento de uma hipótese diagnóstica, já que a avaliação é sempre um
corte transversal, ou seja, uma avaliação pontual naquele momento do
desenvolvimento da criança. Assim, avaliação neuropsicológica tem como objetivo,
identificar e descrever mudanças nos funcionamentos cognitivos, comportamental
e/ou emocional em referência a presença/ausência e gravidade, identificando
pontos da cognição da criança, inferindo acerca do distanciamento entre o
resultado nos testes e o esperado para a idade; determinar a correlação entre a
neuroanatomia e neurofisiologia e os resultados: detecção, graduação e
localização de lesão cerebral; determinar se as discrepâncias observadas entre o
esperado e o encontrado na avaliação são associadas com doenças neurológicas,
psiquiátricas, transtornos do desenvolvimento entre outros; avaliar mudanças na
evolução e sugerir prognóstico; oferecer informações para reabilitação e/ ou
planejamento educacional; avaliar a eficácia do tratamento medicamentoso e
terapêutico e oferecer informações a família sobre as dificuldades cognitivas da
criança.
Este processo de avaliação pressupõe alguns passos
tais como: entrevista inicial, planejamento da avaliação, seleção de
instrumentos, analise e integração de dados. A seleção dos testes deve oferecer
um panorama das funções cognitivas, favorecendo um exame eficiente, permitindo
formar um diagnóstico dos prejuízos cognitivos, de forma que o resultado final
forneça um perfil neuropsicológico do paciente, a partir da queixa apresentada,
o nível evolutivo da criança, o tempo e o custo.
Atualmente, o exame neuropsicológico é uma
ferramenta muito útil para questões clinicas como diagnostico diferencial, tendo
como base as ideias de que as alterações neurobiológicas nos diferentes
transtornos neuropsiquiátricos podem provocar manifestações cognitivas e
comportamentais específicas, e a comparação entre tais alterações é muito útil.
Neste sentido, podemos identificar três situações: Primeiro em condições em que
a avaliação cognitiva é estritamente necessária, como no Retardo Mental, os
Transtornos Específicos da Aprendizagem e o Comprometimento Cognitivo Leve,
estando à avaliação cognitiva em um papel complementar a outros exames. Também é
bastante útil na identificação de síndromes neurológicas clássicas como Afasias,
Amnésias, Apraxias, Agnosias, entre outras, traçando o perfil de funções mentais
preservadas e comprometidas; na segunda condição, a avaliação contribui, mas não
é necessária, estando os casos em que as alterações cognitivas não figuram de
forma específica nos critérios diagnósticos, elucidando questões pontuais, sendo
útil na identificação de comorbidades ou na exclusão de outros quadros. E por
fim, onde o exame contribui minimamente para o diagnostico, apresentando outras
aplicações clinicas,como no caso de Disfunções Executivas que ocorrem com
frequência em Transtornos como TAB,TDAH, Esquizofrenia, e TOC,apresentando
sintomatologia e manifestações comportamentais que podem ser bastante
semelhantes, porem os componentes e a hierarquia das disfunções não são
iguais,como nos dois primeiros, onde em ambos ocorre um déficit da motivação,
porém um é secundário à aceleração do pensamento, já em outro leva á
impersistência da atenção.Também fornece dados importantes em quadros de difícil
separação como a síndrome de Asperger e os Transtornos de Aprendizagem
Não-Verbal.Os tratamentos medicamentosos e os tipos de terapia ou treinos
indicados em cada caso também são diferentes, incluindo avaliação das
consequências e o impacto psicossocial das dificuldades cognitivas,
possibilitando o planejamento de intervenções específicas e de um aconselhamento
pessoal/familiar eficaz.
As possibilidades da avaliação neuropsicológica são
múltiplas, na medida em que ela se processa com testes quantificáveis
específicos e investigando amplamente o funcionamento, permitindo estabelecer se
há distúrbio ou déficit, se eles têm relação com a doença presente ou sugestiva
de uma desordem não diagnosticada no presente. Estabelece que funções, áreas ou
sistemas cerebrais podem estar envolvidos e quais hipóteses diagnósticas podem
ser feitas a partir do exame, contribuindo para o entendimento e para manejo de
quadros tão diversos, mostrando-se assim, um instrumento de investigação vasto e
de grande importância.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBIRATO, Fábio; DIAS, Gabriela. A mente de seu
filho: como estimular crianças e identificar os distúrbios psicológicos na
infância. Rio de Janeiro: Agir, 2009.
CAIXETA, Marcelo; COSTA OLIVEIRA CÉSAR; Fernando;
CAIXETA, Leonardo; NÓBREGA, Magno; HANNA, Marcelo. Neuropsicologia dos
Transtornos Mentais. São Paulo: Artes Médicas, 2007.
EKMAN, Laurie Lundy. Neurociência: Fundamentos
para a Reabilitação. Rio de Janeiro: Elsevier 2004.
FUENTES, Daniel; MALLOY-DINIZ, Leandro F; FUENTES;
CAMARGO H. PIRES, Cândida; COSENZA M., Ramon. Neuropsicologia: Teoria e
Prática. Porto Alegre: Artmed, 2008.
JR. ASSUMPÇÃO, Francisco; VALLE, Luiza Helena;
WAJNSZTEJN, Rubens; FUENTES, Daniel; MALLOY-DINIZ, Leandro. Aprendizagem na
Atualidade: Neuropsicologia e Desenvolvimento na Inclusão. São Paulo: Novo
Conceito, 2010.
MALLOY-DINIZ, Leandro F; FUENTES, Daniel; MATTOS,
Paulo; ABREU; Neander. Avaliação Neuropsicológica. Porto Alegre:
Artemed,2010.
MIRANDA, Mônica; MUSZKAT, Mauro; MELLO, de Berlim
Cláudia. Neuropsicologia do Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Rúbio,
2013.
TEIXEIRA, Antônio; KUMMER; Arthur.
Neuropsiquiatria Clínica. Rio de Janeiro: Rúbio, 2012.
SADOCK, Benjamin; SADOCK, Virginia. Manual
Conciso de Psiquiatria da Infância e Adolescência. Porto Alegre: Artmed,
2011.
VALLE, Luiza Helena; VALLE, Eduardo.
Neuropsiquiatria: infância e adolescência: abordagem multidisciplinar de
problemas na clínica, na família e na escola. Rio de Janeiro: WAK, 2007.